* José Cruz
Para
quem tem dúvidas, a corrupção no esporte ocorre de várias formas. Nas últimas
décadas, muitos desvios de grana ocorriam quando gente do extinto Ministério do
Esporte ignorava prestações de contas fraudadas do dinheiro liberado. Ou
aprovava relatórios de mentirinha, como se a grana tivesse sido aplicada no fim
proposto. Se mexerem nesse passado!...
Em
outros casos, superfaturavam compras de equipamentos. Nos Jogos Pan-Americanos
2007 e Olimpíada 2016, o Tribunal de Contas da União identificou faturas pagas
em dobro! E até faturas que foram pagas por serviços sequer prestados...
Há
um caso, que já narrei no UOL, mas vale repetir, pois demonstra como o
“sistema” é real e poderoso. Foi entre 1994 e 1997, período em que Ary Graça
sucedeu a Carlos Arthur Nuzman na presidência da Confederação Brasileira de
Vôlei.
Resumo
da jogada: Em 1995, a Confederação de Vôlei recebeu o equivalente a US$ 3,5
milhões do patrocinador, Banco do Brasil, para realizar 17 etapas do Circuito
de Vôlei de Praia, categorias masculina e feminina. Mas, ao contrário do ano
anterior, só dez etapas foram realizadas, apesar de ter sido destinado o mesmo
valor. O então deputado federal Augusto Carvalho quis saber, onde foi parar a
grana de 14 etapas não realizadas?
O
surpreendente resultado está em detalhes na Decisão 855/1997, do Tribunal, de
Contas da União. Em resumo, foi o seguinte: Fernando Gonçalves, o então
ministro-relator desse processo, no TCU, adoeceu e foi substituído por Lincoln
Magalhães da Rocha que, também se afastou do caso por motivo de saúde. Em
sorteio, a relatoria foi para o ministro Adhemar Ghizi, casualmente, sogro do
ex-craque do vôlei, Bernard Rajzman, criador do saque “jornada nas estrelas”,
amigo e braço direito de Carlos Arthur Nuzman, ex-presidente da Confederação de
Vôlei e do COB e, claro, íntimo de Ary Graça.
O
relatório do ministro Ghizi não deixou Bernard mal diante dos amigos. Depois de
vasta argumentação, demonstrando pouca importância com o ocorrido, ele
escreveu: “... o cerne das questões suscitadas pelo deputado Augusto Carvalho
escapa à competência desta Corte (TCU), uma vez que não nos cabe fiscalizar o
funcionamento da Confederação Brasileira de Vôlei...”
Mas,
a questão é que o Banco do Brasil foi ludibriado na exposição de sua marca, já
que pagou por 17 etapas do circuito e não apenas dez.
E
disse mais o senhor Ghizi: “Na verdade, sendo tais verbas recebidas pela CBV a
título de pagamento de contrato, não tem este Tribunal qualquer poder
fiscalizatório em relação à utilização futura das verbas”.
Com
esse argumento, o parecer foi aprovado e o assunto encerrado. E ninguém ficou
sabendo onde foi parar a grana das 14 etapas não realizadas. Nesse caso, o
“sistema” foi influenciado pelo vínculo familiar.
O
“sistema” que esconde a corrupção em geral é interligado entre os poderes da
República, independentemente de partido ou de quem esteja no governo. O sistema
se mantém nas transições e nele agem amigos, políticos, parentes, clientes,
lobistas, servidores, especialistas em transporte de malas... etc.
A
troca de favores, o tráfico de influência etc seguem a cartilha de São Francisco:
“É dando que se recebe”...
Por
isso, não seria exagero plagiar o Presidente da República e dar nova ordem ao
credo: “Deus acima de todos e o Sistema acima de tudo”.
José Cruz, jornalista e comentarista esportivo.
Colaborador do Jornal PODIUM desde 2011.
Artigo publicado originalmente na
coluna Campo Livre - UOL.
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