sábado, 30 de março de 2019

A fábula esportiva de Cinderela


Por José Cruz
            A cada quatro anos o brasileiro descobre que há vida esportiva fora do futebol. Por breves dias, os olímpicos e paralímpicos nos permitem esquecer o jogo da bola para vibrar com pódios na ginástica, no vôlei, no judô ou no atletismo, como se fossem raros gols de Neymar... Ao final, nos satisfazemos com pingadas medalhas, apesar do tamanho, da diversidade e do potencial humanos do nosso país para formar bons competidores em todas as modalidades. Proporcionalmente, os paraolímpicos mostram mais resultados.
            O ano de 2020 está chegando e lá vai o Brasil rumo a Tóquio: Olimpíada, de 24 de julho a 9 de agosto, e Paralimpíada de 25 de agosto a 6 de setembro. Nesses eventos, saberemos se os investimentos públicos para os Jogos Rio 2016 deixaram legados de fato. 
            Os governos das últimas décadas apostaram no esporte para exibir ao mundo o nosso potencial e capacidade de, também, conquistar pódios. Dinheiro não faltou, mas planejamento de longo prazo e fiscalização sim. A corrupção e o desperdício foram enormes, já comentados neste espaço. Agora, a conta amarga do jogo dos espertos chegou, e a falta de dinheiro e a choradeira são reais. 
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            Há três anos, depois de apagada a chama olímpica no Rio de Janeiro, lancei as seguintes questões em um artigo que provocava sobre o nosso futuro esportivo:
“O que será do amanhã? A chegada de novo governo ao poder da República e a gravidade da economia tornarão o esporte uma `fábula de Cinderela´, como no conto de fadas em que uma carruagem volta às suas origens, uma abóbora?
            E indaguei mais: “As estatais continuarão a jogar dinheiro nas confederações”? “O Ministério do Esporte terá orçamento para manutenção e conservação das 47 pistas de atletismo que distribuiu pelo país”? E por aí segui numa série de dúvidas que, hoje, temos as tristes respostas.
            Pois o novo governo chegou. O déficit total projetado nas contas públicas deste ano é de R$ 130 bilhões, o que endurece o jogo da liberação de grana pública para o esporte. O Ministério foi extinto, e a recém-criada Secretaria de Esporte ainda não tem equipe titular completa. As verbas secaram. E, apesar de termos um presidente formado em Educação Física e egresso das Forças Armadas, de tradicional vínculo com a prática esportiva, os rumos do esporte estão à deriva.
            Diante das mazelas da saúde, da educação e da segurança, compreende-se que o esporte não esteja entre as prioridades do atual governo. Mas, também, não se pode ignorar o que foi construído em termos físicos e humanos para os Jogos Rio 2016. Ao ignorar isso, o governo apressa o desmonte do que restou e repete, indiretamente, o desperdício de governos passados.

José Cruz, jornalista e comentarista esportivo. 
Colaborador do Jornal PODIUM desde 2011.
Artigo publicado originalmente na
coluna Campo Livre - UOL.

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